Comecei a ouvir Elis Regina por causa da minha avó. Ela tem discos de vinil da cantora e adora cantarolar suas músicas enquanto faz a cama ou lava a louça. Logo que comecei a ouvir achei que a voz da Elis era linda, e só isso. Quando fiquei mais velha é que fui prestar atenção nas músicas que ela cantava, e principalmente na favorita da minha avó: O Bêbado e a Equilibrista. Essa música não fala exatamente de um bêbado e uma equilibrista, mas é sim uma música emblemática, cheia de referências ao período em que foi composta. "O Bêbado e a Equilibrista", de 1979, foi a canção tema da luta pela anistia e da campanha das Diretas Já!.
A música de João Bosco, com letra de Aldir Blanc usa a noite e o escuro para simbolizar a época em que se vivia; o regime totalitário. A tarde caiu, como desabou o viaduto Paulo de Frontin em 1971, abruptamente, e logo veio a noite. Fala-se de um bêbado trajando luto que lembra Carlitos, o famoso personagem de Charlie Chaplin com sua aura de liberdade, utopia e mesmo irreverência. Irreverência essa repetida pelo bêbado que ao invés de reverenciar a escuridão, "fazia irreverências mil pra noite do Brasil".
E a canção segue. O Brasil sonha com a volta dos exilados - "do irmão do Henfil", o Betinho, ativista dos direitos humanos que foi exilado no Chile e depois morou no Canadá e no México. E então chora "a pátria mãe gentil" como canta o nosso hino nacional. "Choram Marias e Clarisses", a mãe de Betinho, a mulher de Vladimir Herzog, e tantas outras mães, esposas, irmãs e filhas.
Mas no final o que conta é a esperança. Mesmo que ela tenha que se equilibrar em um fio tênue e atravessar a noite. Se por acaso se machucar? Azar! Ela, a esperança equilibrista, sabe que "o show de todo o artista tem que continuar".
Como várias outras músicas do período, "O Bêbado e a Equilibrista" foi uma maneira de protestar, de abrir os olhos e de refletir. A arte nessa época era uma válvula de escape. Se não se pode falar sobre, que se cante então. "O Bêbado e a Equilibrista" é tão forte quanto a ressaca do bêbado e tão precisa quanto a ponta dos pés da equilibrista sobre a corda.
Assista ao clipe apresentado no Fantástico - Elis Regina em "O Bêbado e a Equilibrista":
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Essa música é show. Demorei muito pra conhecer melhor o trabalho da Elis e me arrependo por isso. Hj sempre paro pra ouvir/ler/assitir qqer coisa q se refira a ela como este texto. Vale muito a pena
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