03 março, 2011

Sobre músicos e ditadores

Por Luiza Barros


Lionel Richie se apresenta diante da casa bombardeada de Muammar Kadhafi, em 2006


Kadafi, Kadhafi, Khadafi, Gaddafi, Qaddafi. Não importa como esteja escrito, o nome do ditador da Líbia é um dos mais mencionados no noticiário recente. A postura arrogante do ditador perante manifestantes que clamam por mais liberdade chamou a atenção do mundo inteiro, e acabou respingando no universo da música. Isso porque o clã dos Kadhafi tem, há anos, dado cachês bem gordos para estrelas internacionais em troca de shows particulares.

Entre essas estrelas, está a cantora Beyoncé, que como foi dito ano passado em A Trilha Sonora, recebeu em torno de R$2 milhões para se apresentar numa festa do filho de Kadhafi, Mutassim Bilal “Hannibal” (sim, o nome é exatamente esse que você leu). Hoje, 3 de março, a cantora afirmou que doou o dinheiro que ganhou na ocasião há mais de um ano. A antiga vocalista do Destiny's Child não é a primeira a tentar se desvincular da imagem de Kadhafi. Dois dias atrás, a canadense Nelly Furtado anunciou no twitter que doaria o milhão de dólares que recebeu para cantar para a familia do ditador na Itália, em 2007.

Nelly e Beyoncé não estão sozinhas. Na festa em que Beyoncé se apresentou, realizada na ilha caribenha de St. Bartes, estavam presentes ainda Jay-Z, o marido da cantora, e celebridades como Bon Jovi, Lindsay Lohan e Usher. Antes disso, Mutassim Kadhafi já tinha dado US$1 milhão a Mariah Carey por um show de apenas quatro músicas, no réveillon de 2008. Em 2005, o romântico Lionel Richie e o tenor José Carreras se apresentaram no que o governo da Líbia chamou de "concerto para a paz". O evento, realizado em frente à casa bombardeada de Kadhafi, na capital Tripoli, marcava os 20 anos da operação das forças armadas americana que atacou o país em resposta a um atentado em Berlim.

Manic Street Preachers tocam em Cuba, em 2001

Fora do exemplo libanês, há vários casos de estrelas que não resistiram ao cachê alto oferecido por ditadores conhecidamente cruéis. Um ano atrás, o ex-líder do Police, Sting, queimou feio a sua reputação de defensor dos direitos humanos ao aceitar mais de £2 milhões para tocar para a filha de Islam Kasimov. No poder do Uzbequistão desde 1991, Kasimov é acusado de assassinar seus inimigos políticos.

Da mesma maneira, até Bob Marley, lendariamente ligado ao pacifismo, chegou a tocar para Robert Mugabe e uma plateia de 10 mil pessoas, durante a festa de independência do Zimbabue, em 1980. O mais ironico de tudo, Marley não era a primeira opção de Mugabe. O presidente de um dos países mais pobres da África preferia o britânico Cliff Richards. Ainda no continente africano, James Brown e B.B. King, entre outros, se apresentaram na década de 70 para Mobutu Sese Seko, governante da República Democrática do Congo de 1965 a 1997.

Do outro lado do Atlântico, o caso mais recente foi o dos roqueiros do Manic Street Preachers, que tocaram para Fidel Castro em 2001. A banda galesa ainda aproveitou uma das falas do líder cubano para nomear o DVD que a viagem originou. "Louder than war" foi escolhido como título depois que Fidel, ao ser avisado que o som da banda era pesado, respondeu que não podia ser mais alto do que o barulho da guerra.

Um comentário:

  1. Oi Luiza achei muito legal a abordagem desse tema.
    Muitos artistas tem ao longo do tempo se manifestado em defesa da Democracia e da Paz, sendo emblemáticas músicas de John Lennon e Stevie Wonder, que se manifestavam contra a guerra do Vietnã.Mas parece que o senso crítico e posicionamento político de outrora vem sendo ofuscado pelo brilho intenso de moedas.
    Ricardo Castro

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